domingo, 27 de abril de 2014

DMU / SURDOCEGUEIRA


DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA X SURDOCEGUEIRA

 

Deficiência Múltipla (DMU) e surdocegueira são muito confundidas por apresentar algumas características em comum, contudo são duas situações que necessitam ser estudadas a fundo para identificar suas peculiaridades e assim realizar intervenções que potencializem as possibilidades de uma melhor qualidade de vida e autonomia dessas crianças, jovens e adultos.

Segundo (Perreault, 2002) Considera-se uma criança com múltipla deficiência sensorial aquela que apresenta deficiência visual e auditiva associadas a outras condições de comportamento e comprometimentos, sejam eles na área física, intelectual ou emocional, e dificuldades de aprendizagem. Quase sempre, os canais de visão e audição não são os únicos afetados, mas também outros sistemas, como os sistemas tátil (toque), vestibular (equilíbrio), proprioceptivo (posição corporal), olfativo (aromas e odores) ou gustativo (sabor). Limitações em uma dessas áreas podem ter um efeito singular no funcionamento, aprendizagem e desenvolvimento da criança Crianças que apresentam graves comprometimentos múltiplos e condições médicas frágeis:

1. Apresentam mais dificuldades no entendimento das rotinas diárias, gestos ou outras habilidades de comunicação;

2. Demonstram dificuldades acentuadas no reconhecimento das pessoas significativas no seu ambiente;

3. Realizam movimentos corporais sem propósito;

4. Apresentam resposta mínima a barulho, movimento, toque, odores e/ou outros estímulos.

Muitas dessas crianças têm dificuldade na obtenção e manutenção do estado de alerta. Isso é crítico porque a prontidão é o estado comportamental em que as crianças estão mais receptivas à estimulação, aprendem melhor e são capazes de responder de uma maneira socialmente aceita. Crianças com múltipla deficiência sensorial têm uma variedade de necessidades especiais que se assemelham às necessidades da criança surdocegueira.

Segundo (McInnes & Treffy, 1991) A criança com surdocegueira não é uma criança surda que não pode ver e nem um cego que não pode ouvir. Não se trata de simples somatória de surdez e cegueira, nem é só um problema de comunicação e percepção, ainda que englobe todos esses fatores e alguns mais. Para Telford & Sawrey (1976), quando a visão e audição estão gravemente comprometidas, os problemas relacionados à aprendizagem dos comportamentos socialmente aceitos e a adaptação ao meio se multiplicam. A falta dessas percepções limita a criança surdocegueira na antecipação do que vai ocorrer a sua volta. A entrada da mãe no quarto do bebê, por exemplo, pode não significar tranquilidade, comida ou carinho, mas pode promover instabilidade e insegurança.

Segundo Amaral (2002), relata a necessidade de abordagens funcionais e coativas no atendimento à criança surdocega. A abordagem funcional salienta a necessidade de dotar a criança surdocega com aprendizagens significativas para a sua vida futura, salientando a necessidade de aprendizagens centradas em experiências reais do dia a dia. A abordagem coativa tem como base os estudos de Van Dijk (1989). Autores como Jurgens (1977), MacFarland (1995), Fernandez (1997), Petersen & Santos (2000), entre outros, apontam a constatação de Van Dijk de que as experiências motoras realizadas pela criança, em conjunto com o professor, por meio do movimento coativo constituem o fundamento e a base do desenvolvimento e da aprendizagem. Elas fornecem à criança surdocega melhor qualidade e quantidade de interações com pessoas, objetos e acontecimentos. Nesse processo, a função do professor é proporcionar pontos de referência que permitam à criança organizar seu mundo, estimulando-a e motivando-a a se comunicar e se relacionar com o mundo a sua volta (Writer, 1987; Bloom, 1990; Watkins & Clark, 1991; Wheeler & Griffin, 1997). Nesse enfoque, o elemento central é o próprio corpo da criança, suas necessidades, desejos e interesses. O professor e a criança se movem e atuam permitindo a esta descobrir o seu próprio corpo como instrumento para explorar o mundo. A viabilização dessa comunicação inicial pode ser realizada a partir do programa de comunicação de Jan Van Dijk. Esse programa compreende seis fases:

 1)  Relação de apego e confiança - A fase da relação de apego e confiança  consiste no desenvolvimento de um vínculo afetivo entre a criança e o adulto;

 2)  Fenômeno de ressonância - A ressonância consiste no movimento corpo a corpo, sendo que a iniciativa do movimento parte da criança;

 3)  Movimento coativo - O movimento co-ativo ou mão sobre mão, caracteriza-se pela ampliação comunicativa entre o estimulador e a criança, em um espaço mais amplo;

4)   Referência não-representativa - O objetivo da fase da referência não representativa consiste em propiciar condições para que a criança compreenda alguns símbolos indicativos de atividades, pessoas e situações;

5)   Imitação - A imitação visa estimular a criança na realização das atividades propostas. Representa a continuação do movimento coativo. A distinção principal entre eles é que na imitação a criança realiza a ação após demonstração do professor, na presença ou ausência dele, enquanto no movimento coativo a ação é simultânea;

 6) Gestos naturais - Van Dijk (1968) afirma que os gestos naturais surgem a partir das experiências com as qualidades motoras dos objetos, sendo constituídos por movimentos das mãos quase iguais aos objetos da ação. Stillman & Battler (1984) sugerem que os gestos devem ser espontâneos, e não criados em situações estruturadas.

Objetos de referência

Podemos usar objetos de referência utilizados diariamente em diferentes atividades, os quais são apresentados às crianças como pistas, indicando o que vai acontecer a seguir ou o que ela irá fazer. Os objetos de referência são importantes principalmente quando existe um tempo de espera entre o momento da tomada de conhecimento do que vai acontecer e o tempo que a atividade demora para começar.

 O objetivo do desenvolvimento dessas fases consiste em viabilizar melhores condições de aprendizagem de um sistema de comunicação pela criança, ampliando suas potencialidades de interação com o ambiente.

Sistema braile tátil ou manual

Esse é um sistema de comunicação alfabético baseado no sistema braile, tradicionalmente utilizado por cegos nas atividades de leitura e escrita. Em alguns casos pode-se utilizar o braile digital. Esse sistema segue as mesmas regras e convenções do braile tradicional (os dedos indicador e médio representam a cela braile e em cada falange dos dedos representa o espaço de marcação do ponto). Sua utilização ocorre no próprio corpo da pessoa surdocega e de seu interlocutor, em geral usando os dedos mencionados. Assim, a marcação dos pontos é realizada no dedo indicador e médio os quais representam as celas, e cada uma das falanges representará a marcação de cada ponto.

 

Bibliografia

- McINNES. Deafblindness: a unique disability. In: McINNES, John M. (Org.) A guide to planning and support for individuals who are deafblind. Canada: University of Toronto Press Incorporated, 1999.

 _____ & TREFFY, J. A. Deaf-blind infants and children: a developmental guide. Trad. Mary Inês R. M. Loschiavo. São Paulo: AHIMSA, 1991.

- PERREAULT, Stephen. Alguns pensamentos sobre atendimentos a crianças com últipla deficiência. In: MASINI, Elcie F.S. (Org.) Do sentido... pelos sentidos...para o sentido. São Paulo: Vetor Editora, 2002. pp. 113-118.

- STILLMAN, R. A. Y. B. & BATTLER, C. W. O desenvolvimento da comunicação pré-lingüística

em deficientes graves - uma interpretação do método Van Dijk. Tradução: Mary Inês R. Mendes Loschiavo. Annals of the Seminars in Speech and Language 5(3): 159-170. 1984.

-TELFORD, C.W. & SAWREY, J.M. O indivíduo excepcional. Rio de Janeiro: Zahar Editores. 1976. 2ª ed.

- VAN DIJK, Jan. Movement and communication with rubella children. Tradução: Dalva Rosa. Conferência na Reunião Geral Anual da Organização Nacional de Cegos de Madrid: ONCE, 1968.