DEFICIÊNCIA
MÚLTIPLA X SURDOCEGUEIRA
Deficiência
Múltipla (DMU) e surdocegueira são muito confundidas por apresentar algumas
características em comum, contudo são duas situações que necessitam ser
estudadas a fundo para identificar suas peculiaridades e assim realizar
intervenções que potencializem as possibilidades de uma melhor qualidade de
vida e autonomia dessas crianças, jovens e adultos.
Segundo
(Perreault, 2002) Considera-se uma criança com múltipla deficiência sensorial
aquela que apresenta deficiência visual e auditiva associadas a outras
condições de comportamento e comprometimentos, sejam eles na área física,
intelectual ou emocional, e dificuldades de aprendizagem. Quase sempre, os
canais de visão e audição não são os únicos afetados, mas também outros
sistemas, como os sistemas tátil (toque), vestibular (equilíbrio),
proprioceptivo (posição corporal), olfativo (aromas e odores) ou gustativo
(sabor). Limitações em uma dessas áreas podem ter um efeito singular no
funcionamento, aprendizagem e desenvolvimento da criança Crianças que
apresentam graves comprometimentos múltiplos e condições médicas frágeis:
1. Apresentam mais dificuldades no
entendimento das rotinas diárias, gestos ou outras habilidades de comunicação;
2. Demonstram dificuldades acentuadas no
reconhecimento das pessoas significativas no seu ambiente;
3. Realizam movimentos corporais sem
propósito;
4. Apresentam resposta mínima a barulho,
movimento, toque, odores e/ou outros estímulos.
Muitas dessas crianças têm dificuldade na
obtenção e manutenção do estado de alerta. Isso é crítico porque a prontidão é
o estado comportamental em que as crianças estão mais receptivas à estimulação,
aprendem melhor e são capazes de responder de uma maneira socialmente aceita.
Crianças com múltipla deficiência sensorial têm uma variedade de necessidades
especiais que se assemelham às necessidades da criança surdocegueira.
Segundo (McInnes & Treffy, 1991) A
criança com surdocegueira não é uma criança surda que não pode ver e nem um
cego que não pode ouvir. Não se trata de simples somatória de surdez e
cegueira, nem é só um problema de comunicação e percepção, ainda que englobe
todos esses fatores e alguns mais. Para Telford & Sawrey (1976), quando a
visão e audição estão gravemente comprometidas, os problemas relacionados à
aprendizagem dos comportamentos socialmente aceitos e a adaptação ao meio se
multiplicam. A falta dessas percepções limita a criança surdocegueira na
antecipação do que vai ocorrer a sua volta. A entrada da mãe no quarto do bebê,
por exemplo, pode não significar tranquilidade, comida ou carinho, mas pode
promover instabilidade e insegurança.
Segundo Amaral (2002), relata a necessidade
de abordagens funcionais e coativas no atendimento à criança surdocega. A
abordagem funcional salienta a necessidade de dotar a criança surdocega com aprendizagens
significativas para a sua vida futura, salientando a necessidade de aprendizagens
centradas em experiências reais do dia a dia. A abordagem coativa tem como base
os estudos de Van Dijk (1989). Autores como Jurgens (1977), MacFarland (1995),
Fernandez (1997), Petersen & Santos (2000), entre outros, apontam a
constatação de Van Dijk de que as experiências motoras realizadas pela criança,
em conjunto com o professor, por meio do movimento coativo constituem o
fundamento e a base do desenvolvimento e da aprendizagem. Elas fornecem à
criança surdocega melhor qualidade e quantidade de interações com pessoas,
objetos e acontecimentos. Nesse processo, a função do professor é proporcionar
pontos de referência que permitam à criança organizar seu mundo, estimulando-a
e motivando-a a se comunicar e se relacionar com o mundo a sua volta (Writer,
1987; Bloom, 1990; Watkins & Clark, 1991; Wheeler & Griffin, 1997). Nesse
enfoque, o elemento central é o próprio corpo da criança, suas necessidades, desejos
e interesses. O professor e a criança se movem e atuam permitindo a esta
descobrir o seu próprio corpo como instrumento para explorar o mundo. A
viabilização dessa comunicação inicial pode ser realizada a partir do programa
de comunicação de Jan Van Dijk. Esse programa compreende seis fases:
1) Relação
de apego e confiança - A fase da relação de apego e confiança consiste no desenvolvimento de um vínculo afetivo
entre a criança e o adulto;
2) Fenômeno
de ressonância - A ressonância consiste no movimento corpo a corpo, sendo que a
iniciativa do movimento parte da criança;
3)
Movimento coativo - O movimento co-ativo ou mão sobre mão,
caracteriza-se pela ampliação comunicativa entre o estimulador e a criança, em
um espaço mais amplo;
4) Referência não-representativa - O objetivo
da fase da referência não representativa consiste em propiciar condições para
que a criança compreenda alguns símbolos indicativos de atividades, pessoas e
situações;
5) Imitação - A imitação visa estimular a
criança na realização das atividades propostas. Representa a continuação do
movimento coativo. A distinção principal entre eles é que na imitação a criança
realiza a ação após demonstração do professor, na presença ou ausência dele, enquanto
no movimento coativo a ação é simultânea;
6) Gestos naturais - Van Dijk (1968) afirma
que os gestos naturais surgem a partir das experiências com as qualidades
motoras dos objetos, sendo constituídos por movimentos das mãos quase iguais aos
objetos da ação. Stillman & Battler (1984) sugerem que os gestos devem ser
espontâneos, e não criados em situações estruturadas.
Objetos de referência
Podemos usar objetos de referência utilizados
diariamente em diferentes atividades, os quais são apresentados às crianças
como pistas, indicando o que vai acontecer a seguir ou o que ela irá fazer. Os
objetos de referência são importantes principalmente quando existe um tempo de espera
entre o momento da tomada de conhecimento do que vai acontecer e o tempo que a atividade
demora para começar.
O objetivo
do desenvolvimento dessas fases consiste em viabilizar melhores condições de
aprendizagem de um sistema de comunicação pela criança, ampliando suas
potencialidades de interação com o ambiente.
Sistema braile tátil ou manual
Esse é um sistema de comunicação alfabético
baseado no sistema braile, tradicionalmente utilizado por cegos nas atividades
de leitura e escrita. Em alguns casos pode-se utilizar o braile digital. Esse
sistema segue as mesmas regras e convenções do braile tradicional (os dedos indicador
e médio representam a cela braile e em cada falange dos dedos representa o
espaço de marcação do ponto). Sua utilização ocorre no próprio corpo da pessoa
surdocega e de seu interlocutor, em geral usando os dedos mencionados. Assim, a
marcação dos pontos é realizada no dedo indicador e médio os quais representam
as celas, e cada uma das falanges representará a marcação de cada ponto.
Bibliografia
- McINNES. Deafblindness: a
unique disability. In: McINNES, John M. (Org.) A guide to planning and support
for individuals who are deafblind. Canada: University of Toronto Press Incorporated,
1999.
_____ & TREFFY, J. A. Deaf-blind infants
and children: a developmental guide. Trad. Mary Inês R. M. Loschiavo.
São Paulo: AHIMSA, 1991.
-
PERREAULT, Stephen. Alguns pensamentos sobre atendimentos a crianças com últipla
deficiência. In: MASINI, Elcie F.S. (Org.) Do sentido... pelos sentidos...para
o sentido. São Paulo: Vetor Editora, 2002. pp. 113-118.
-
STILLMAN, R. A. Y. B. & BATTLER, C. W. O desenvolvimento da comunicação
pré-lingüística
em
deficientes graves - uma interpretação do método Van Dijk. Tradução: Mary Inês
R. Mendes Loschiavo. Annals
of the Seminars in Speech and Language 5(3): 159-170. 1984.
-TELFORD,
C.W. & SAWREY, J.M. O indivíduo excepcional. Rio de Janeiro: Zahar
Editores. 1976. 2ª ed.
- VAN DIJK, Jan. Movement and
communication with rubella children. Tradução: Dalva Rosa. Conferência
na Reunião Geral Anual da Organização Nacional de Cegos de Madrid: ONCE, 1968.